Concepções sobre avaliação educacional de intelectuais acadêmicos brasileiros nos anos 1980

Regilson Maciel Borges e José Carlos Rothen


Regilson Borges Maciel
José Carlos Rothen
O artigo discute a constituição do campo da avaliação educacional no Brasil a partir das concepções de intelectuais acadêmicos brasileiros que ajudaram a construir esse campo de conhecimento ao longo da década de 1980. Para esse fim, realizou-se uma pesquisa de caráter bibliográfica e documental, associada às estratégias dos estudos bibliométricos e à análise de conteúdo. Os dados foram organizados em duas principais abordagens de avaliação educacional, uma que enfatiza a avaliação como resultado e a outra cujo enfoque da avaliação é o processo. Nessas abordagens, as concepções dos intelectuais indicam que a avaliação é uma atividade inerente ao fazer humano e por isso não pode ser reduzida a uma ação mecânica, pois implica numa relação de poder e de negociação entre avaliador e avaliado.
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Considerações finais

O artigo apresentou as concepções sobre avaliação educacional de intelectuais acadêmicos brasileiros interessados nesta temática durante a década de 1980, ressaltando como esses autores compreendem o conceito de avaliação dentro de duas abordagens de avaliação, uma que concebe a avaliação como medidas de resultados e a outra que prioriza a participação nos processos avaliativos.

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Na abordagem de avaliação baseada em resultados os estudos são basicamente de cunho quantitativo, resultantes de pesquisas sobre a aprendizagem dos alunos e outros baseados em indicadores de produção científica brasileira, tangencialmente aparecem trabalhos que conceituam e definem a avaliação nessa perspectiva objetivista. A avaliação nessa abordagem se confunde com a mensuração do rendimento escolar aferida por meio de testes que possibilitariam medir com rigor a aprendizagem dos alunos. As medidas também se traduzem nos indicadores da produção científica da pós-graduação que indicariam a qualidade dos cursos de mestrados e doutorados no país.

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Na abordagem de avaliação baseada em processos os estudos são em sua maioria de cunho qualitativo, resultantes de análises teóricas da literatura da área e de proposições de metodologias para a avaliação da educação. A avaliação nessa abordagem aparece como possibilidade de se conhecer como foi construída a teoria em avaliação educacional a partir da literatura estadunidense, assim como evidencia os esforços de estudiosos brasileiros em esboçar uma teoria e prática de avaliação que pudesse ser aplicada à realidade educacional brasileira.

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Nessa última abordagem se destacam os trabalhos de Pedro Demo com suas ideias iniciais sobre uma prática de avaliação participante e qualitativa, que visava uma educação transformadora, também Ana Maria Saul com sua proposta democrática de avaliação emancipatória para reformulação de cursos e programas educacionais, Menga Lüdke com seu olhar sociológico sobre os fenômenos avaliativos e sua defesa por uma sociologia da avaliação educacional, Cipriano Carlos Luckesi com sua proposta de ultrapassagem do autoritarismo que, por vezes, tem marcado a avaliação escolar e Léa Depresbiteris com seu olhar inovador em torno de uma avaliação da aprendizagem participativa na formação profissional.

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Entretanto, apesar do surgimento dessa linha de análise crítica do papel da avaliação, nota-se que ainda é constante no período, a presença de estudos com forte viés quantitativista, destacando-se os estudos sobre a construção, validação e qualificação técnica de instrumentos de medidas elaborados por Heraldo Marelim Vianna, os trabalhos sobre a avaliação do rendimento dos alunos realizados por Heraldo Marelim Vianna e Bernardete Gatti, as análises sobre os exames vestibulares desenvolvidas por Heraldo Marelim Vianna, Sergio Costa Ribeiro e Adolpho Ribeiro Netto, e as apreciações em torno dos indicadores da produção científica da pós-graduação brasileira tratadas por Simon Schwartzman e Cláudio de Moura Castro.

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É no interior dessas abordagens que os intelectuais e grupos colocam em prática suas relações de complementaridade, nos quais os agentes se tornam detentores de um capital científico fundado no conhecimento e no reconhecimento (BOURDIEU, 2004b), cujo poder consiste na imposição de uma definição da ciência, que se revela nas posições epistemológicas que buscam justificar as estratégias colocadas em ação (BOURDIEU, 1983), assim como também servem para colocar em descrédito os defensores de outras posições. Daí nosso entendimento do campo enquanto espaço estruturado de posições, que é marcado pelas relações de força e disputas de poder (BOURDIEU, 2003), onde o que se encontra em jogo é o monopólio pela legitimidade da autoridade científica (BOURDIEU, 2004b).

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No caso específico do campo da avaliação educacional no Brasil na década de 1980 a ideia de complementaridade constitui boa parte da lógica de funcionamento desse campo no país, quando as aproximações entre as duas abordagens de avaliação educacional – avaliação como resultado e avaliação como processo – mostram que avaliar é uma atividade complexa e multidisciplinar, e que por isso mesmo não pode ser reduzida a uma função mecânica, mas trata-se de um ato de poder, e enquanto tal pode ser exercido para a dominação ou para a promoção do bem comum.

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A exposição da lógica de funcionamento do campo científico a partir da relação de complementaridade presente nas ideias dos diferentes autores que discutem a temática da avaliação no período não exclui alguns dos pressupostos que constituem o campo, tais como a concorrência, as competições, lutas e disputas que são características inerentes ao campo e estimulam o seu funcionamento, mesmo porque complementaridade não quer dizer harmonia, pois neste jogo há os que ganham e os que perdem, sobretudo, se imaginamos que o campo brasileiro da avaliação educacional nos anos 1980 está em processo de constituição, com tudo acontecendo ao mesmo tempo, de maneira complexa e dinâmica, o que nos possibilita, inclusive, um olhar sobre quem nele está entrando e quais as posições assumidas.

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