Teto dos gastos e a ciência: o orçamento da CAPES

É possível ciência, tecnologia e desenvolvimento com o limite dos gastos públicos? “Que país querem” com os cortes do orçamento da CAPES?

No dia 02/08 a Presidência da CAPES divulgou carta pública ao Ministério da Educação informando que o orçamento da agência para 2019 permitirá que somente até agosto sejam honrados os pagamentos das bolsas para pós-graduandos e para professores da educação básica. Este fato é decorrência da aplicação da emenda constitucional que limita os gastos públicos.

Diante dessas notícias tem-se as perguntas: qual a visão de país que está por traz das políticas de contenção de gastos? Qual o papel da ciência para o desenvolvimento do país? Seria ingênuo afirmar que as atuais políticas são elaboradas a partir de um projeto de país, muito mais parecem ações para agradar alguns setores da sociedade que se alimentam de um antipetismo com o objetivo de manter-se no poder. O que não impede de tentar identificar para que visão as ações apontam.

Na história brasileira, pós independência, podemos resgatar duas visões de país; aquela que compreende que a origem da riqueza está em manter o sistema colonial exportador de produtos agrícolas, e a outra, baseada na ideia de que o “progresso” está vinculado a produção industrial, que, por sua vez, depende da produção de tecnologias. Equivocadamente se vincula o “atraso” à agricultura e o “progresso” à indústria. O que está em jogo não é o atraso ou o progresso, mas a dependência ou não externa.

As políticas que associam a ideia de independência normalmente compreendem que a ciência tem um papel importante para o desenvolvimento do país. Nesta esteira surgiram os institutos de pesquisa aplicada, como a Embrapa, Instituto Manguinhos, o CNPq, a Capes etc. Após o golpe de 1964, enraizada na ideologia “Brasil Potência”, teve-se a regulação da pós-graduação e o seu crescimento exponencial, a pós-graduação teria como objetivo criar a tecnologia brasileira.

A ciência e a indústria brasileiras não andam de mãos dadas. Na primeira metade do século passado, vigorava o mito que havia tecnologia disponível no mercado internacional. Bastaria importar máquinas dos países desenvolvidos que a tecnologia viria incorporada nela; não precisaríamos produzir tecnologia, bastaria importá-la. Doce ilusão! O que havia disponível no mercado internacional eram máquinas velhas com tecnologia obsoleta que precisavam ser vendidas. Na segunda metade do século, o mito da tecnologia disponível se apresenta no incentivo a instalação de empresas multinacionais no solo brasileiro. Elas trariam as máquinas, a tecnologia e o capital, assim o país se desenvolveria.

Historicamente a burguesia brasileira se desenvolveu a sombra da internacional. Para boa parte do empresariado, associar-se ao capital internacional significa manter-se bem situada na hierarquia social. Mesmo que parte significativa da riqueza gerada no Brasil não fique aqui, que as decisões sejam tomadas nos escritórios dos países centrais, sobram migalhas de riquezas e de poder para o empresariado brasileiro.

A partir dos anos 1970, o sistema financeiro, com a crise do petróleo e o consequente aumento da dívida dos Estados nacionais, passa a ter papel central na organização do capitalismo. Os Estados, ao rolarem a sua dívida, cumprem papel importante em transferência de riquezas do setor produtivo para o financeiro.

Nos anos 1990, criou-se a ilusão de que a classe média não precisaria dos serviços públicos do Estado e que poderia comprar serviços básicos como saúde, educação, etc., nas empresas privadas, e que o Estado seria um peso para o desenvolvimento da economia. A partir de 2016, com o impeachment (ou golpe) e o aprofundamento da crise econômica, no clima de antipetismo, foram adotadas políticas no sentido de reduzir direitos sociais e de diminuição do Estado.

Voltemos a questão do corte dos investimentos em ciência e a visão de país. Como o empresariado brasileiro não precisa da ciência, pois a tecnologia é fornecida pelos “parceiros” (senhores) internacionais, não há porque produzir ciência e tecnologia nacional. Para esta visão tosca, não há necessidade de investimento público, pois os investidores trarão o capital necessário.  O mito da tecnologia disponível casa-se com o mito do capital disponível, ou seja, não há necessidade de se fazer ciência com investimento público. Diante da possível crítica de que a grande maioria da população é excluída, respondem facilmente: “não sejamos comunistas”. O país desejado por estas políticas é de uma economia pequena, na qual o Estado cumpre o papel de transferir renda do setor produtivo para o setor financeiro e o empresariado brasileiro vive bem como vassalo do capital internacional.