Gladys Barreyro e José Carlos Rothen
O artigo trata do processo de elaboração e implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Mostra-se que, na lei que o institui, estão presentes concepções antagônicas de avaliação e que essa recebe influências díspares como a do Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB) e a do Exame Nacional de Cursos (ENC). Conclui-se que o SINAES tem o mérito de sinalizar uma mudança na concepção da avaliação com foco no mercado para a ênfase na melhoria da qualidade. Contudo, a indefinição do modelo de avaliação adotado mostra as oscilações da política de educação superior do governo Lula.
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Considerações finais
O SINAES foi estabelecido por uma lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República, um ano depois do início do governo Lula, sendo esse um dos poucos atos legislativos educacionais desse governo. A lei aprovada implica a criação de um Sistema de Avaliação e não de instrumentos isolados estabelecidos por leis, decretos e portarias ministeriais.
O SINAES sinaliza uma mudança na concepção da avaliação, passa do foco da concorrência institucional pelo mercado para o da melhoria da qualidade, afirmando valores ligados à educação superior como bem público e não como mercadoria (art. 1 § 1°).
Mas, o SINAES é o resultado da cumulação e da metamorfose. Os três pilares que constituem o Sistema atualmente são derivados das experiências anteriores: a) a Avaliação Institucional, do PAIUB, b) a Avaliação dos Cursos de Graduação, da Avaliação das Condições de Ensino e c) o Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes, do Provão. A cumulação dos mecanismos de avaliação foi realizada sem considerar que cada um deles é produto de valores e paradigmas divergentes: a visão formativa/emancipatória do PAIUB, fundada na participação e na autonomia institucional, a visão somativa da Avaliação das Condições de Ensino e o mecanismo de ranking do Provão.
A tentativa da conciliação das diferentes concepções de avaliação – e de educação superior – e a indefinição de qual concepção é a adotada como oficial mostram a falta de consenso quanto à política de educação superior do governo Lula, apesar do manifestado no seu Programa de Governo.
Muitas das incongruências do SINAES são resultado da tentativa de implantar uma sistemática de avaliação sem qualquer relação com a elaboração de um projeto de política de educação superior, isto é, sem discussão prévia do tipo de instituições desejado.
Quanto aos resultados em si, ainda não é possível “avaliar a avaliação”, pois, por um lado, o SINAES conseguiu ressignificar o ritual anual de divulgação de resultados do Provão, instaurando um outro tempo, reforçando a ideia de processo e formação; por outro, não se conseguiu realizar um ciclo completo de avaliação, tanto que os resultados das avaliações institucional, de curso e dos estudantes, integrados, ainda não foram finalizados.
Ao jornal O Estado de S. Paulo,20 o atual presidente do INEP, Reynaldo Fernandes, afirma temer “que o ENADE seja mudado caso o PSDB vença as eleições presidenciais deste ano”. Resta saber se esses temores devem ser considerados apenas quanto à possibilidade de mudança de partido ou também quanto à permanência no governo do próprio PT. Esta dúvida origina-se nos avatares ministeriais que evidenciam a falta de consenso no próprio partido no governo, quanto à avaliação e às políticas para a educação superior no país. A própria Lei n. 10.861/ 04, com a coexistência de modelos díspares de avaliação que apresenta, pode servir para um ou outro fim, dependendo dos grupos atuantes no Governo e no Ministério da Educação.
BARREYRO, Gladys Beatriz; ROTHEN, José Carlos”SINAES” contraditórios: considerações sobre a elaboração e implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior. Educação e Sociedade, v. 27, p. 955-977, 2006.
Veja Avaliação e Regulação da Educação Superior brasileira: história e políticas