Avaliação da educação superior, reforma do Estado e agências reguladoras nos governos FHC

José Carlos Rothen e Gladys Beatriz Barreyro

Este artigo analisa o conceito de agência reguladora e suas implicações nas políticas para a educação superior durante os governos de Fernando Henrique Cardoso. São revisados os conceitos de regulação e agências reguladoras e sua significação na agenda governamental. As agências reguladoras, no marco da reforma do Estado iniciada nesse governo, inserem-se na proposta de um Estado com menor intervenção na prestação de serviços e com a promoção de atividades privadas. Porém, no âmbito do Ministério da Educação, a ênfase não foi na criação de agências, mas no fortalecimento do Estado avaliador. O Estado foi o mediador entre o fornecedor de educação superior (as IES) e o mercado consumidor, informando à população os resultados da sua avaliação e autorizando o funcionamento das IES

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Considerações Finais

A regulação está ligada com o poder de polícia do Estado, isto é, de restringir a liberdade individual em nome do bem comum, para impedir o indivíduo de realizar algumas ações e obrigá-lo a realizar outras. No exercí- cio desse poder, o Executivo tem o papel de fazer a regulamentação técnica das leis.

A Reforma do Estado iniciada no governo Fernando Henrique Cardoso tinha como pressuposto que o Estado deveria deixar de prestar serviços que não lhe fossem exclusivos e diminuir, significativamente, a ingerência política na regulação técnica das atividades econômicas. Nesse sentido, tendo como inspiração o direito administrativo norte-americano, foram criadas diversas agências reguladoras.

As agências reguladoras, no discurso oficial, teriam como característica principal a autonomia em relação ao Estado e, como objetivos principais: garantir a competividade privada; defender os interesses dos consumidores; estimular o investimento privado; garantir a remuneração dos investimentos; aumentar a qualidade com a redução de custos; resolver os conflitos entre os agentes econômicos e coibir o abuso do poder econômico.

A agenda política para a educação superior nesse período incorporou a visão da educação como mercadoria, fosse no âmbito nacional, fosse na internacionalização da educação superior. A expansão desse nível de educação, realizada no país pela via privada, contou com mudanças legislativas que flexibilizaram as normas que regulamentavam o sistema, principalmente com a LDB de 1996. Em movimento aparentemente contrário ao que estava sendo efetivado em outras áreas do governo, na educação diminuiu-se o poder de um dos órgãos que a regulamentavam, em outras palavras, com a extinção do Conselho Federal de Educação e a criação do Conselho Nacional de Educação, concentrou-se no Ministério da Educação o poder de regulamentar o sistema.

Coerente com a visão da época, apesar de concentrar poderes, o ministério diminuiu os mecanismos de fiscalização e controle do sistema. Tendo como justificativa a necessidade de superar a visão burocrática da fiscalização, criou-se um mecanismo de avaliação pelo qual se teria o controle do sistema, sendo o Exame Nacional de Cursos o seu primeiro e principal instrumento. A regulação, dentro dessa visão, fundamentava-se basicamente na avaliação, cujos resultados permitiriam ao mercado consumidor de educação e ao ministério regular o sistema.

Com a transformação do Inep em uma autarquia responsável pela avaliação, pode-se dizer que, na educação, não houve a criação de uma agência de regulação, mas, sim, de uma agência de avaliação, esta executora do cerne da política de expansão da educação superior via iniciativa privada. Na educação superior, a ênfase da ação estatal não seria a típica do Estado provedor (apesar de manter IES públicas federais) nem de um Estado regulador, mas, sim, teria a figura de um Estado avaliador. Em outras palavras, não promoveria a educação superior nem elaboraria as normas, bem como não assumiria o papel de fiscalizar as instituições. Em última instância, o Estado cumpriria o papel de mediar a relação entre o fornecedor de educação superior (as IES) e o mercado consumidor. Essa mediação ocorreria tanto pelo fato de o Estado avaliador informar à população os resultados da sua avaliação como no sentido de autorizar o funcionamento das IES.

Como última consideração, apontamos que, apesar de no início do governo Lula as agências reguladoras terem sido tratadas com certa desconfiança, a sua criação na educação não é desestimada, tanto que, como nos mostra Rodrigues (2007, p. 129), parte dos mantenedores de IES particulares defendem a existência destas com a finalidade de diminuir a intervenção estatal no sistema.

 

ROTHEN, José Carlos; BARREYRO Gladys Beatriz. Avaliação da educação superior, reforma do Estado e agências reguladoras nos governos FHC. Revista Espaço Pedagógico, v. 15, n. 1, Passo Fundo, p. 120-134, jan./jun. 2008

Veja Avaliação e Regulação da Educação Superior brasileira: história e políticas