O artigo resulta de pesquisa que buscou identificar o conceito de qualidade presente nos documentos oficiais e dispositivos legais brasileiros publicados no período de 2003 a 2013.
O material foi selecionado no Portal Domínio Público do MEC e no sítio do INEP. No levantamento encontrou-se um total de 27 documentos. Para análise dos usos do conceito de qualidade os documentos foram organizados em cinco categorias temáticas:Qualidade como base para a fundamentação legal; Qualidade tendo como referência a avaliação institucional; Qualidade como relevância social; Quando a qualidade é excelência; Qualidade baseada em índices e indicadores. Concluímos que não existe uma definição única do que seria qualidade, mas sim uma flutuação no uso do termo que varia de uma visão “formativa-educativa” para uma visão “gerencialista”. Ressaltamos que a discussão acerca da qualidade da educação não deve se restringir aos documentos oficiais, aos dispositivos legais e aos pesquisadores, deve-se transpor os limites teóricos e chegar às instituições, ao professorado, aos estudantes e demais agentes envolvidos e comprometidos com a educação superior.
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Considerações Finais
O artigo teve por objetivo identificar o conceito de qualidade na educação superior presente nos documentos oficiais e nos dispositivos legais elaborados no Brasil no período de 2003 a 2013. Cabe destacar que as concepções de qualidade variaram ao longo do tempo, pois, inicialmente o termo qualidade aparece associado a uma qualidade formativa-educativa que possibilita desvelar a realidade institucional por meio da produção de valores e de sentidos para os envolvidos num sistema global e integrador, sendo em seguida adotada uma visão de qualidade gerencialista voltada para eficiência, eficácia e produtividade, em que, práticas regulatórias foram ganhando força e espaço ao ponto de apenas uma dos eixos avaliativos do SINAES determinar a qualidade ofertada pelas IES.
Nos primeiros anos de implantação do SINAES (2003-2004), quando os documentos abrangem o período da regulamentação a implementação do SINAES, nota-se uma perspectiva de qualidade que aponta para uma visão formativa-educativa. Nesse período a ênfase se encontra na melhoria da qualidade e na responsabilidade social, abrangendo a IES de forma global e integradora. O alcance da qualidade perpassa, portanto, desde questões político-sociais, como a expansão de oportunidades educacionais, até a aferição da aprendizagem dos alunos, sua formação para a cidadania e para o mundo do trabalho, entendendo-se, assim, que uma avaliação educativa deve ser “uma produção de sentidos sobre o cumprimento, pelos sistemas e pelas instituições, das finalidades de formação de cidadãos, aprofundamento dos valores democráticos da vida social, e elevação material e espiritual da sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2008a, p. 193).
Veja a pesquisa sobre qualidade da educação superior
Posteriormente, no movimento de desenvolvimento e consolidação do SINAES (2005-2013) o termo qualidade passou a assumir cada vez mais a ideia de instrumentos, roteiros e diretrizes, sobretudo a partir do Decreto 5.773 de 2006, quando a qualidade surge numa perspectiva gerencialista e distancia-se de sua formulação inicial que propunha uma visão de qualidade formativa-educativa. Isso pode ser encontrado de modo mais claro e direto nos documentos que normatizam a criação dos índices e indicadores, caso do CPC e do IGC, e na ênfase da excelência como um indicador da qualidade. Em razão dessas medidas “o SINAES, ainda em processo de consolidar-se como cultura, pouco a pouco foi perdendo sua riqueza teórica e sua potencialidade ético-política e foi se reduzindo a ÍNDICES” (DIAS SOBRINHO, 2008b, p. 820).
Barreyro e Rothen (2014) analisando a política de avaliação da educação superior desenvolvida durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), corroboram com a afirmação anterior, na medida em que os autores concluem que o SINAES tentou empreender uma mudança na lógica da avaliação instituída desde o Provão no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). Contudo, os autores ressaltam que “em sua implantação, o SINAES sofreu profundas transformações a partir da criação do Conceito Preliminar de Cursos (CPC) e do Índice Geral de Cursos (IGC), que foram incorporados ao final do segundo Governo Lula” (BARREYRO; ROTHEN, 2014, p. 61), assim, “a avaliação formativa é ‘des-induzida’, ao privilegiar os resultados do ENADE sobre os outros” (ROTHEN; BARREYRO, 2011, p. 31).
As avaliações se justificam pela busca da melhoria da qualidade rumo a excelência da educação superior, contudo essa é uma interpretação particular. Nos documentos analisados não é encontrado essa afirmação, inclusive, um dos únicos momentos em que é mencionado o termo excelência esse veio referenciar a grande dificuldade em um curso conseguir a excelência, visto que um pequeno detalhe em que a instituição não atinja a nota máxima nas avaliações pode comprometer esse diagnóstico.
Concluímos que os resultados obtidos das avaliações podem promover a qualidade gerencialista ou formativa-educativa, bem como, as duas concomitantemente, visto que, apesar de haver diferenças entre elas, possuem uma proximidade, que é apresentar ao final do processo a melhoria daquilo que foi avaliado. Ressaltamos que a discussão sobre qualidade da educação superior não deve ficar restrita aos documentos e pesquisadores, mas deve transpor os limites teóricos e chegar às instituições, aos professores e envolvidos com a educação, pois, a qualidade da educação possui diversas faces que merecem ser compreendidas e exploradas para os benefícios a todos.