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O fenômeno Bolsonaro: a encarnação do antipetismo

O que teria feito surgir o fenômeno Bolsonaro? Segundo as pesquisas eleitorais, ele terá muitos votos e, ao mesmo tempo, apresenta grande índices de rejeição. Mas o que teria levado ao seu surgimento? Pensei em perguntar, informalmente, aos meus conhecidos as razões para votar em Bolsonaro, contudo nenhum deles manifestam que irão votar nele. Na busca de uma resposta comecei a resgatar, na minha memória, os acontecimentos políticos dos últimos anos, os quais foram campo fértil para o surgimento de uma candidatura forte.

Apesar de ser um político antigo, Bolsonaro passa a ser conhecido nacionalmente no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. O período eleitoral, que antecedeu o segundo governo Dilma, foi marcado por forte acirramento, por Fake News propagados em redes sociais e a divulgação da ideia de que combater a corrupção significa combater o PT. Em meio a tudo isso, temos a fase final da eleição de 2014, que se concentrou na polarização entre os candidatos do PSDB e do PT, ou seja, entre Aécio Neves e Dilma Rousseff.

A classe média não se via atendida pelas políticas desenvolvidas pelos governos petistas, que correspondem a uma mistura de políticas que compreendem que a população deve comprar os serviços públicos e que o Estado deve desenvolver políticas focais de atendimento aos mais necessitados. Uma mistura de privatização com intervenção Estatal. A classe média que havia aderido à ideia de que ela poderia comprar os serviços públicos (saúde, educação etc.) começa a perceber, com a crise econômica, que efetivamente não consegue. A sua insatisfação será direcionada para um antipetismo. Em um texto intitulado, uma carta a um amigo, escrito na época, analiso a visão da classe média.

O antipetismo é um movimento que tem como sua principal bandeira o combate a corrupção estrutural na política brasileira. O antipetismo parte da ideia de que a corrupção teria sido uma criação do Partido dos Trabalhadores (PT) para se manter no poder. O antipetismo também se dirige, no campo social/econômico, contra as políticas focais e a intervenção do Estado na economia; no campo social/moral, contra as políticas de defesa das minorias.

Ao assumir o governo, Michel Temer fez aliança com os partidos que perderam a eleição. A sua manutenção no poder foi garantida ao alimentar-se do antipetismo e com a promessa de que seriam realizadas reformas que retirariam o Brasil do buraco. Foi feita uma reforma trabalhista, ameaçou a realização da reforma da previdência,  a promulgação da emenda do teto dos gastos públicos, , e muitas outras medidas nessa linha.

Nas eleições municipais de 2016, o PT teve grande revés eleitoral e os seus adversários ganharam na onda do antipetismo. A vitória mais representativa foi a de João Doria (PSDB) em São Paulo, no primeiro turno, baseado em um discurso antipetista. Uma das suas frases representativas é que ele iria visitar Lula em Curitiba, fazendo referência a uma possível condenação de Lula pelo juiz Sérgio Moro, o que acabou ocorrendo.

O PSDB encarnava a representação do antipetismo e do combate a corrupção. Contudo esse papel acabou sendo abalado. Entendo que duas circunstâncias abalaram essa primazia, a primeira foi a denúncia de Joesley Batista de que ele fazia pagamentos a Aécio Neves, abalando assim a ideia da primazia do PT no campo da corrupção. A segunda, a percepção de que as políticas implantadas no governo Temer não resolveram, como se esperava, a crise econômica brasileira. Representativo dessa crise foi o movimento dos caminhoneiros, em maio de 2018, contrário a política de preços de combustíveis e a favor do tabelamento dos fretes.

Todo o movimento de impeachment aflorou em muitos a desconfiança das virtudes da democracia, muitos passaram a expressar a ideia de que seria melhor uma intervenção militar para resolver os problemas brasileiros. Por exemplo, no movimento dos caminhoneiros encontrava-se faixas pedindo uma intervenção.

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Nesta dupla crise (econômica e moral), com a desconfiança na democracia e com o antipetismo ainda em alta, foi que a figura de Bolsonaro encarna definitivamente a figura do antipetismo. A sua carreira foi construída em torno de um discurso que tem como porta de entrada a defesa do uso de armas pela população como mecanismo de combate a violência, a crítica das políticas de defesa das minorias, bem como a defesa da ditatura militar. A sua fala é um discurso de desvalorização da mulher, de justificação do machismo e homofóbica. A fala não é construída a partir de argumentação, mas de expressões fortes, ou seja, apenas afirma a sua ideia de forma violenta.

A campanha do Bolsonaro é uma “não” campanha. Ele tem 8 segundos da televisão e depois do atentado sofrido não participa dos debates e muito menos faz campanha de rua. O seu discurso não encampa questões econômicas. Para resolver essa desconfiança aproximou-se do economista Paulo Guedes, o qual afiança o seu governo, diante do mercado financeiro. Para fugir das perguntas relativas a economia repete o bordão de um famoso comercial: “pergunta no posto Ipiranga”, ou seja, ao Paulo Guedes. Assim o seu poder de atração resume-se a um conservadorismo moral e político, que não passa por propostas claras, em uma não campanha.

O seu discurso gerou forte reação. Segundo as pesquisas eleitorais ele tem forte rejeição entre as mulheres. De tal modo que, espontaneamente, aflorou um movimento em defesa dos direitos das mulheres, tanto em manifestações nas redes sociais, como em manifestações nas ruas, traduzido pela hashtag “Elenão”. Nas pesquisas eleitorais que seguiram as manifestações, ele teve um aumento significativo das intenções de voto.  Por paradoxal que seja, a sua candidatura em uma “não” campanha se alimenta das críticas a ele. As críticas que recebe reforça exponencialmente a ideia de que ele é o grande representante do antipetismo.

Nascendo em um clima de antipetismo, de decepção com os resultados negativos da economia e com a decepção na democracia, o fenômeno Bolsonaro é, por um lado, uma fé irracional no conservadorismo, e, por outro, é um catalisador de reações contrárias ao machismo e a homofobia.

 

Ps1. após postar este texto encontrei um eleitor do Bolsonaro. Na sua fala fica claro que o ódio dos antipetistas está transformando muitos em prezas fáceis do Bolsonaro.

Ps2 estou recebendo de amigos dicas de videos e leituras, conforme for assistindo e lendo vou disponiblizando aqui

Ver entrevista de Esther Solano que fez pesquisa com eleitores do Bolsonaro